segunda-feira, 5 de setembro de 2016

SEMIDEUS

Todos os dias em frente à minha casa ele passa.
Em seus lábios o doce sorriso de menino carente
E debaixo do braço carrega os livros e se sente
Como se fosse o dono da rua e da beleza esparsa.

Longos e lisos cabelos loiros esvoaçam ao vento
Enfeitando de formosura sua face meiga e branca,
Sua pele brilha diante de um sol que é esperança
Dos dias lineares que vão prestar contas ao tempo.

Em seus olhos azuis há um firmamento de estrelas
Que lhes dá a certeza de que o mundo é multicor
E feliz ele perambula e pulula com entender a dor
Que se estampa em muitos lares de sutis alamedas.

Vaivém diário o leva de ida e de volta aos estudos,
Contudo sua perene alegria enche o espaço de luz,
Pois é um garoto lírico pleno do bálsamo que seduz
Todos os olhares que observam o bailado de veludo.

Trágico deserto é o dia em que se percebe a ausência
Do tesouro que conquista pé ante pé gentes diversas…
O final de semana é de uma angústia intensa e imersa
No silêncio que atrofia a calma sem a jurisprudência.

Ah! Quando chegam as férias, inconcebível o horror
Que se instala nos íntimos que são seguranças da rua,
Ninguém fala ou espirra, tosse alguma tece ou atenua
A tristeza do ícone que locupletou o ambiente de amor.

Retorno às aulas… Lá vem ele e de volta os sorrisos…
É um ídolo natural que se impôs devido à sua fofura,
Lindo como nenhum outro que por ali transita e cura
Qualquer enfermidade que tencione despejar seu siso.

Certa manhã tudo ocorreu diferente… Ouviu-se a voz.
Grande foi o espanto que adentrou nos âmagos e se fez
Do alarido que ziguezagueou no ar um devaneio talvez
De ter entre os moradores o ser dono de todos os sóis…

De fato aconteceu… A formosura trouxe o que é talento
Para residir dentre admiradores que eram total tietagem.
Em todas as casas houve de se transformar a paisagem,
Porque a pura beleza tornou-se monarca, embevecimento.

O tempo consignou essa história… Todos viviam em paz,
Acabaram com o orgulho e o egoísmo, tudo reino do bem.
Ele era o motivo da aliança e tudo era de todos e ninguém
Era mais que outro… Tudo se compartilhava, eram iguais.

Aquela beleza me fascinava… Algo estranho era aquela tez.
Alguns anos mais tarde. O menino tornou-se um belo rapaz
E, num dia de festa em plena praça, diante de todos os sais,
Despiu-se. Mostrou o lindo corpo, abriu as asas e se desfez!




De Ivan de Oliveira Melo

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