quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Desdêmona

Desdêmona
CAPÍTULO II

Primavera, salve a primavera! As flores enchiam os jardins das casas, coloria praças e avenidas, os campos sorriam perante tanta beleza dos mais variados matizes. E o aroma? Ah! Delícia perambular por entre as árvores, sentar-se nos bancos e permitir o olfato mergulhar profundo e consentir o perfume inebriar os pulmões. Respiração adocicada que faz o poeta sonhar e descrever maravilhas com palavras que traduzem a essência da vida, do amor...
Desdêmona passeava com a mãe por jardins públicos próximos à sua casa. Esmengarda estava pesada, prestes a descansar. Ali confabulavam sobre a vida sentimental da moça que se via apaixonada por um jovem de sua idade: 17 anos! Desdêmona sonhava, tagarelava seu nome com ardor e isto a fazia tremer de excitação e, ao mesmo tempo, de um grande temor. Havia um terrível obstáculo às suas aspirações: seu pai! 
- Mãezinha querida, sem Fabian não sei o que será de minha vida - confessou - ele é o ar que respiro, tudo quanto mais almejo no momento.
Esmengarda escutava os delírios da jovem, contudo usava de prudência. 
- Filha, seu pai não pode nem desconfiar desta sua paixão – tremia ao falar - Alexandre acha você muito jovem para pensar em amores. É melhor sufocar esse amor, sublimá-lo... 
Desdêmona não concordava, reagiu como todos os jovens cheios de amor pela vida, no auge de sua adolescência, período em que os hormônios ditam as regras do corpo.
- Mãe! Não posso! Ele é a luz que eu respiro, o luar que adorna as minhas noites, o sol que bronzeia minha pele! Eu o amo, mãe, não me peça para esquecê-lo, é impossível!
Esmengarda estava preocupada, sabia o que um coração apaixonado era capaz de sentir e de fazer. Pedia à filha que não atropelasse os acontecimentos, é que ela estava à beira de trazer seu irmão à vida, não se devia pensar noutras coisas, por enquanto.
- Pelo menos permita à sua mãe o sossego de descansar em paz! - pediu - depois eu mesma terei uma conversa com Alexandre. Prometo!
- Certo, mãezinha, o amor sabe esperar quando ele é verdadeiro - conformava-se - Eu a deixarei trazer meu irmãozinho na santa paz, depois você pensa em mim. Meu pai me odeia! Não posso depender dele para o resto dos meus dias, não posso e não quero.
Tudo ocorreu como mãe e filha combinaram. Esmengarda teve um parto difícil, porém estava bem. Moisés chegara com três quilos e seiscentos gramas. Era um bebê sadio. Alexandre não escondia sua alegria, a satisfação de ser pai de um varão, seu grande sonho.
- Amanhã uma grande “churrascada” aqui. Vamos comemorar a chegada de Moisés. Virão os meus colegas de trabalho e alguns aqui da região.
- Alexandre, eu ainda estou de resguardo, não devo, por enquanto, meter-me a tanto serviço. – Explicou Esmengarda.
- Não se preocupe, mulher. Você nada fará, ficará sentada com Moisés ao colo e recebendo as visitas, só isso.
- E quem cuidará das coisas? - Perguntou.
- Contratei os serviços de três jovens, elas tomarão conta de tudo e deixarão tudo arrumado.
- Ainda bem! - Suspirou Esmengarda.
A festa foi alegre. Muita bebida e comida, como nunca se havia visto em casa de Alexandre, tamanha era a sua euforia. Entre os convidados estavam os pais de Fabian, muito amigos de Alexandre. E o jovem, evidente, não perdera a oportunidade de estar perto de sua amada. Estava louco de paixão por Desdêmona. Aproximou-se da jovem no instante em que a mesma fora dar uma volta pelos oitões da casa.
- Desdêmona, não suporto mais esta distância. Eu a amo, Desdêmona!
- Eu também o quero, Fabian, mas todo o cuidado é pouco, meu pai certamente não concordará com um namoro entre nós agora, ele diz que tenho de crescer primeiro.
- Se não fosse o acordo entre você e sua mãe, com certeza eu o enfrentaria.
- Nem pensar nisso... quer pôr tudo a perder? - retrucou Desdêmona.
- Eu sei. Esperarei. .. Haja paciência !
Chegou-se ao final do festejo. Todos se foram. Alexandre ficou caído no tapete da sala, plenamente tomado pela embriaguez. Esmengarda o deixou a li, porque sabia que quando ele assim estava, era mais violento que o normal. Após os últimos acontecimentos, Alexandre perdera por completo sua saúde. Vivia faltando ao trabalho, reclamando de dores pelo corpo e tinha frequentes enjoos e vômitos. De repente, vomitou muito sangue. Isto apavorou Esmengarda que, mesmo desorientada, levou-o ao médico. Exames feitos, constatou-se um doença perigosa...
- É D. Esmengarda - Leucemia. – Disse o médico - tem pouco tempo de vida. Lamento!
Esmengarda derramou-se em lágrimas. Apesar de grosseiro, Alexandre era sua vida, a menina dos seus olhos. Estava descontrolada.
- Não há nada mais que possa ser feito, doutor? - Interrogou com uma pontinha de esperança. 
- No estágio em que está a doença, é difícil. Mas um último recurso seria um transplante de medula óssea, isso se houvesse alguém compatível que estivesse disposto a fazer a doação. Mesmo assim, as chances são mínimas.
Esmengarda se apegou a estas “chances mínimas!. Iria colocar nos jornais o apelo, tudo faria para salvar seu marido. Tudo! Conversava sobre isto com Desdêmona.
- Hei de encontrar, minha filha, uma criatura que faça esse milagre - falava sem parar.
Desdêmona havia em si uma indecisão. Seu coração apertado, todavia era seu pai e, por mais que não o suportasse, era seu pai!
Trancou-se em seu quarto. Fez acrobacias com seus dons paranormais. Travesseiros su-biam e desciam, caindo sobre a cama. Fez isso com os sapatos, com roupas, chinelos - haveria de tomar uma decisão... Era seu pai!
Voltou à sala onde a mãe pensava, pensava e orava em busca de um “salvador”.
- Mãezinha, estou disposta a submeter-me aos exames. Talvez eu seja compatível, sou filha dele! - Ofereceu-se.
No olhar de Esmengarda, a esperança. Chorava que chorava e falava simultaneamente.
- Filha, será? Você estaria disposta? Ele é tão ruim para você, filha!
- Nestas horas devemos colocar de lado os ressentimentos. Restituirei a ele a vida, caso seja compatível. Por mais que não o admire - ele é meu pai!
E, assim, Desdêmona se pôs à disposição para tentar “ressuscitar” seu genitor...

FIM DO CAPÍTULO II

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